Profundidade de Pensar

Assim ele mergulhava de cabeça.
Não tinha essa de colocar o pezinho, um dedo após o outro, ai que frio acho que não. Não tinha essa, vou com tudo e até o fundo.
Assim ele fazia, sempre o fez, faria todo o sempre.

Entrava dentro da espessura, com ou sem equipamento, cavava. Com as unhas arrancava a primeira pele; logo os dedos como garras arrancavam mais insumos, e com mãos e braços enterrados na areia faz jorrar um sal molhado que ninguém mais vê; são só ondas aos surfistas, paisagem ao turista, cenário ao pintor emoldurado.

Para ele não; ao entrar mais dentro na espessura, era tubo: Pipeline do infinito, conexões tigre e um avanço de mil léguas subaquáticas.

Era telescópio enxergando para dentro, que o saber interior leva a buscas colossais. Para fora é exploração, é trator escavadeira, cientista, pescador. Com o pé no brejo ou o olhar no microscópio, microcosmo vira macro e a minhoca é agora a nutrição do próximo milênio. Um virou bilhão e até o cisco é reciclável, tava lá no meio da espessura.


Entrei, rachei a madeira ao longo. Escancarei o livro e lambi com entusiasmo cada uma das suas milhares páginas, doces como mel, migalhas com manteiga açucarada que são letras ao padeiro, tijolos da construção. Argamassa colando linhas, parágrafos adentro e viro uma densa história narrada; e o herói segue adiante comendo letras, engolindo vírgulas, ruminando exclamações… não há pontos finais, só petróleo cru jorrando de poços quiçá um dia artesanais, que depende da Jornada.


É longa, não se prega o contrário, e ele vai. Na pele do Sr. Ulme, retratado no belíssimo romance Flores, de Afonso Cruz, mesmo desmemoriado ele segue pregando a máxima: “Entremos mais dentro na espessura” e instiga, a nós a refletir. Da tabula rasa já excedemos, penso, mas para existir no mundo de hoje é preciso ir além da densidade.

Comunicação não verbal e a questão do Olhar

Olhe, você está sendo visto! Olhe para mim, que estou olhando para você. Retorno o teu olhar, a ti importo então; e você a mim significa.

Trocando olhares nos assumimos um ao outro e estabelecemos uma conversa-olho; se não sabem, o olho fala, e deveras, muitas vezes mais do que palavras, outras bastam por si só e descartam seu contínuo, o outrora necessário algo a mais, e congelam você num piscar de olhos. Quando vê, já ouviu; fecha os olhos, e não mais. Um silêncio escuro toma conta de você, cego de cera.

Volta a abrir, e ouve. É na empatia dos olhares que a conversa vem adentro, escuta ativa e escuto a a ti; reconheço no outro um outro eu, semelhantes somos aptos de nós.
E decibéis. Ou débeis; enfermas línguas, loucas bocas a falar em disparada, tímpanos exaustos, por favor, me deem um tempo: ‘basta olhar que eu já sei’. ‘Minha mãe olhava eu já sabia’, olho no olho, e uma imagem vale mais que mil palavras, é a janela da alma.

E num recém descoberto PLANETA, o humano de lá grunge, bicho que é. O humano de cá fala, incompreendido; os sons não se conversam e os gestos assumem a forma das possibilidades de diálogo, infrutíferos. “Nenhum lampejo de compreensão iluminou a sua Íris”, pondera Ulysse Merou, o principal personagem de O PLANETA DOS MACACOS, sobre as diversas tentativas de troca com a bela selvagem do distante habitat.

“Por fim olhei para seu olhos…” Mas não adianta: “… seu olhar não simpatizava com o meu.” Era a REALidade de uma Ficção distópica hoje bem concreta: a dificuldade de entender e ser entendido, expressão; e nas páginas desse fabuloso romance atemporal aprendemos que a comunicação, seja ela oral, gestual, visual, pode ser questão de vida ou morte.
Não é mera macaquice.